quarta-feira, 25 de maio de 2011

Ah, O Amor - por José Nêumanne Pinto

A caridade nunca há de acabar, mas as profecias passarão, as línguas cessarão e a ciência será abolida. (Epístola de S. Paulo aos Coríntios, I, 13;8)

Amor é fogo que arde sem se ver (Luís de Camões)

O amor vem
e o amor vai:
quem ama entra,
mas quem ama sai;
quem ama crê,
mas quem ama trai;
quem ama voa,
mas quem ama cai.

O amor nasce do nada
sem uma semente sequer:
não há lei que o impeça
nem norma que o proteja.

O amor é um doce de batata
e tem o sal de todo o mar
no esperma que escorre
e na lágrima que desliza:
o amor paralisa.

Quem ama dança
ao som do silêncio;
quem ama salta
do alto sem rede;
quem ama improvisa
até os caprichos.

O amor nasce do parco:
como um eremita no ermo,
nutre-se de muito pouco
para quase tudo alimentar.

Quem ama não cala,
mas consente;
quem ama só fala
aquilo que sente;
quem ama zela,
aceita e mente.

Amor é presente:
compõe-se de encontros
e acaba em ressentimento,
mantendo-se a todo custo
a força do sentimento.

Eu amo e temo,
tu amas demais,
ele ama a luta
e ela ama a paz.
Nós amamos muitos,
vós amais iguais,
eles amam brutos
e elas amam mais.

Quem ama não pensa
-         só recompensa.
Quem ama compensa
e nunca dispensa.
Quem ama está tenso
-         um fio suspenso.

Amor é febre
que não passa.
Amor é graça
que desgraça.
Amor é sorte
na trapaça.

Amar é perceber
o que ninguém vê.
Amar é se esconder
no meio da massa.
Amar é aparecer
quando ninguém espera mais.
Amar é dar
e conhecer.
Amar é ser
e receber.

Amor é música,
não é máquina,
amor sem camisa
-         suor molha a pele.
Amor a palo seco,
amor a sós;
amores a dois,
a três, a cinco,
o diabo a quatro
(não é o amor teatro?)

O amor derrete
e o amor constrói.
O amor permite
e o amor destrói.
O amor comete
e o amor corrói.

Os eleitos do amor
são sonsos e santos,
são tantos e tontos,
de uma tontura solta,
de uma tontura bela,
que revela
a desarmonia do Caos
e persegue
a harmonia do mundo.

O amor morre ao relento,
como rebanho sem pasto:
não há passado que o ampare
nem futuro que o precipite.

José Nêumanne Pinto


Um comentário:

  1. Que poesia bonita. Eu não conhecia esse autor. De onde ele? Vocês podiam colocar uma minibiografia nos posts, que tal? =)

    ResponderExcluir